Por: Josias de Souza
O setor elétrico brasileiro vive um paradoxo. Neste mês de fevereiro começou a vigorar, sob fanfarras, o desconto médio de 20% nas contas de luz, conforme prometera Dilma Rousseff. Simultaneamente, as distribuidoras de energia elétrica pedem em Brasília autorização para reajustar suas tarifas. O governo diz ‘não’. E busca em segredo uma saída para cobrir um rombo bilionário das empresas.
Deve-se o buraco aos caprichos da natureza. Embora o período seja de águas, chove pouco no Brasil. Em consequência, os reservatórios das hidrelétricas estão abaixo do razoável. Para evitar apagões e racionamentos, acionaram-se as usinas térmicas. O problema é que, além de ser ambientalmente suja, a energia térmica é mais cara. Resultado: subiram os custos das distribuidoras.
Pela lei, as empresas podem repassar essa elevação de custos aos consumidores. Precisam, porém, de autorização da Aneel, a Agência Nacional de Energia Elétrica. Algo que só costuma ocorrer uma vez por ano, quando são repactuadas as tarifas. Em casos de ameaça à saúde financeira, as empresas podem requerer revisões extraordinárias. É o que várias delas resolveram fazer agora.
Acionadas, as autoridades do setor elétrico negam-se, por ora, a autorizar os reajustes. Por duas razões: 1) a elevação de tarifas mastigaria um pedaço do desconto trombeteado por Dilma. 2) os reajustes jogariam gasolina nos já incendiados índices da inflação. Como ainda não inventaram a mágica de retirar cartolas de dentro dos coelhos, o buraco na escrituração das empresas cresce na proporção direta da embromação de Brasília.
A primeira vítima da encrenca é a transparência. Sonega-se ao brasileiro o tamanho do rombo. Na semana passada, o presidente de uma grande distribuidora de energia da região Sudeste informou em reunião do conselho que o uso das térmicas abrirá neste ano uma fenda de algo como R$ 25 bilhões na escrituração das empresas do setor.
Um secretario estadual de energia ouvido pelo repórter estimou que o vermelho no balanço das distribuidoras deve roçar os R$ 10 bilhões já em março. Mantidas em operação as térmicas, a cifra dobraria até julho. O blog apurou no Ministério de Minas e Energia que a Eletropaulo informou ao governo o seguinte: apenas no mês de janeiro, o uso da energia térmica custou à empresa um passivo de cerca R$ 1 bilhão.
Em negociações que se intensificaram na semana passada e serão retomadas nesta segunda-feira (25), empresas e governo buscam uma saída. Em meio às conversas reluzem dois vocábulos: Tesouro Nacional. Sim, isso mesmo. Um das alternativas que se encontram sobre a mesa é a injeção de dinheiro do contribuinte nas empresas. Nada a ver com os mais de R$ 8 bilhões que o governo gastará para implementar a poda nas contas de luz. Será dinheiro novo.
Se Dilma Rousseff não der meia-volta, terminará virando gestora de um contra-senso: num instante em que o governo deveria recomendar comedimento aos consumidores de energia, estimula-se o esbanjamento de milhares de megawatts que escasseiam nas hidrelétricas. Não se pode exigir da presidente que faça chover. Mas pode-se pedir a ela que se abstenha de mandar a lógica ao raio que a parta.
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